Foto: DIVULGAÇÃO: www.marciomeirelles.com.br
Reproduzimos aqui, para os fãs deste incansável construtor, esta entrevista cedida ao site Rebucetê. Com vocês, Marcio Meirelles:
Marcio
Meirelles é diretor teatral, cenógrafo e figurinista. Trabalha com Teatro desde
1972 e é um dos diretores mais atuantes do país. Nasceu em Salvador-BA em 26 de
maio de 1954 e é responsável pela revitalização do tradicional Teatro Vila
Velha, em Salvador. Também criou, em 1990, juntamente com Chica Carelli, o
Bando de Teatro Olodum.
Além
de fundador do grupo Avelãz y Avestruz (1976-1989) e criador/diretor do espaço
cultural A Fábrica (1982), durante os anos de 1985 e 1986, Márcio assumiu a
chefia dos núcleos de cenografia e figurino e de direção e elenco da TV
Educativa da Bahia. Paralelamente, criou o Projeto Teatro para a Fundação
Gregório de Mattos (1986). Foi também diretor de um dos maiores centros
culturais do Brasil, o Teatro Castro Alves, em Salvador, de 1987 a 1991,
durante o governo Waldir Pires.
Marcio
foi Secretário de Cultura da Bahia (Secult- Ba). Em entrevista, ele fala sobre
formação, carreira e sobre a gestão na Secult-Ba, e entre uma pergunta e outra,
expressa seu amor pelo teatro.
Minha
formação é de palco. Comecei a fazer teatro universitário em 72, quando
vivíamos uma ditadura muito brava. Depois fiz teatro com duas pessoas, Jurema
Pena e José Wilker. Fazia artes visuais, depois fiz um ano e meio de
arquitetura. Tudo isso me levou a criar um grupo chamado Avelãz y Avestruz, e
com esse grupo a gente trabalhou 8 anos, de 76 a 83. Depois a gente fez mais um
espetáculo, em 89 e foi meu aprendizado, com um grupo de atores no qual a
maioria deles estavam começando ou nem era ator. Foi uma coisa longa e
duradoura, esse aprendizado. Depois fui aprendendo com o mundo, fui aprendendo
no palco. Acho que teatro a gente aprende na vida. A gente vai se
formando a cada espetáculo, a cada projeto. Eu tenho ideia do que quero dizer
com aquilo, de quem quero atingir com aquilo e porque que vou fazer aquilo
naquele momento. Mas como chegar ao resultado, é um aprendizado em cada
projeto.
Quais
foram as dificuldades encontradas em sua gestão como secretário de Cultura?
Foram
basicamente três. A primeira foi o entendimento do governo. Apesar de eu ter
tido muito apoio, por exemplo, da Secretaria da Fazenda. A gente acha que tudo
na cultura é excepcional. Não é verdade. Tudo pode ser usado, pensado, agido,
planejado, como qualquer atividade social, comercial, industrial, educacional,
etc. Quando o estado entender isso vai ter mais investimento em cultura. E aí
vem a outra questão, a sociedade e os produtores culturais não entendem isso,
ou não querem entender, porque é mais fácil ser mantido pelo estado ou por
alguém, e é mais fácil chorar, queixar, esbravejar e fazer campanha contra
porque tem microfone aberto, porque durante anos construiu uma imagem,
construiu, talvez, uma importância simbólica para a sociedade. E o outro grande
problema é a questão do pacto federativo. Porque a gente sabe: em saúde e
educação, por exemplo, que é o papel do estado e do município e do governo
federal, e em cultura é uma confusão. O estado tem que fazer políticas de
apoio, não apoiar diretamente com o dinheiro, necessariamente, mas com
políticas que façam com que aquilo permaneça, avance, evolua e gere resultados
para a sociedade. Mas, um país, como diz Milton Santos, onde não temos
cidadãos, porque as elites não querem ser cidadãos, querem privilégios, e os
pobres nunca tiveram condições de ser cidadãos, é um país complicado. Embora eu
ache que isso tem mudado. Com todas as críticas que se possa fazer ao governo
Lula e ao governo Dilma, acho que tem um avanço, inclusive essa própria onda de
denúncia e de abertura de inquéritos e de percepção da corrupção, como um
câncer no país, é parte de resultado de uma politização da sociedade.
Faça
uma crítica à atual gestão da Secretaria de Cultura e compare com a sua.
Não.
Não posso. Porque, primeiro é muito cedo. São dois anos apenas. Acho que não
posso fazer nem uma reflexão de fato da minha própria gestão, porque muitas
consequências veem depois. Há uma continuidade de muitas coisas, há um desvio
em outras, há um repensamento. Mas eu sinto que tem um caminho também. É estranho
comparar, porque é outro momento. Quatro anos se passaram e muitas coisas
aconteceram. Teve coisas que a gente conseguiu, que a Secretaria de Cultura no
governo Wagner conseguiu avançar em termos de políticas da cultura. E outras,
que a gente não conseguiu, principalmente nesses fatores que assinalei. Outras
coisas conseguimos avançar e está sendo aperfeiçoado. Por exemplo, fizemos um
estudo sobre as manchas culturais do estado e isso só ficou pronto agora e só
foi publicado agora. No entanto, começou na minha gestão. A lei orgânica foi
construída nos primeiros quatro anos e aprovada no quinto. Agora, o estado tem
uma lei que o organiza. Eu acho que daqui a cinco anos ou seis a gente pode
avaliar o resultado do que está acontecendo.
Quais
eram os tipos de cobranças e como a Secretária lidava durante a sua gestão?
Em
várias ordens e de vários lugares. Tinha a cobrança do próprio governo, dos
artistas e da população. E eu preferia atender e equilibrar as demandas da
população com as demandas do governo, de uma política desse governo, que era
uma política que eu seguia e acreditava. Por isso aceitei ser secretário de
cultura por quatro anos e não quis mais do que quatro anos. Eu me preparei para
quatro anos e em quatro anos plantei o que achei que podia plantar. A partir
daí, não queria mais, não gostaria de continuar, ao menos que não houvesse
jeito. Mas uma coisa fundamental é essa coisa republicana que o governador
sempre falou para nós, secretários, que a gente deveria tratar todos os
municípios igual e independentemente do partido político que estava no poder
naquele momento.
Você
é filiado a algum partido político?
Não
sou, nem nunca fui de partido algum. Sempre tratei todos os governos
republicanamente. Nunca troquei favores. Todo mundo sabe que não sou
simpatizante de partido algum. Só aceitei ser secretário e emprestar naquela
época meus 35 anos de história pública à aquela gestão, porque acreditava no
projeto. Não foi pelo partido. Evidentemente, o pensamento de esquerda
influencia, pois a sociedade pensa o ser humano mais do que o desenvolvimento
econômico, o desenvolvimentismo. Às vezes acho que o próprio governo da Bahia
ou do Brasil avançam perigosamente nesse sentido de ignorar questões
ambientais, questões culturais em prol de um fictício desenvolvimento econômico
ou industrial. Me incomoda, eu critico e criticarei sempre.
Um
gestor sempre precisa tomar decisões imediatas. Você se arrepende de alguma
decisão que tenha tomado. Sofreu retaliação por algo?
Não
me arrependo de nada, pois tudo foi pensado dentro de uma lógica, de um
princípio, de valores que continuo mantendo. Tomaria de novo. Te digo
sinceramente: em minha vida pessoal foi mais complicado e mais difícil lidar
com isso do que publicamente, como gestor, porque as pessoas que são afetadas
de alguma forma pela política ou por algum encaminhamento tentam atingir você
de alguma forma na sua vida pessoal acusando pessoas de sua família. É difícil
de lidar, pois eu gosto muito de justiça.
Defina
Márcio Meirelles diretor, artista e produtor cultural.
Não
sei. O dia que eu souber isso serei um artista realizado e paro de fazer
qualquer coisa. Sou uma construção. Eu sou uma construção coletiva. Cada
momento é um momento novo pra mim, uma descoberta nova. Como político e gestor,
como tudo, eu vou sendo construído. E me deixo construir pela história, pelas
competências, pelos resultados, pelas demandas e pelas colaborações, que são
muitas.
*Jessica Lemos é estudante de Comunicação Social
na
Universidade Federal da Bahia (Ufba) e nova colaboradora d'O Rebucetê.
Entrevista cedida ao site Rebucetê. Por Jessica
Lemos* e Susana Rebouças
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